- Back to Home »
- administração , Brasil , carreira , comercio , conhecimento , consumidor , curiosidade , empreendedorismo »
- Um brasileiro no topo do mundo
Posted by : Unknown
sexta-feira, 1 de março de 2013
Maior empresa de informações financeiras do mundo, a inglesa Experian
tem desde o dia 1o de janeiro um novo presidente para a Europa, Oriente
Médio, África e América Latina. Trata-se do gaúcho Francisco Valim, 46
anos, que estará à frente de uma área de negócios que responde por
metade dos US$ 4 bilhões de faturamento global da companhia.
"Os executivos brasileiros hoje são vistos com outros olhos no cenário internacional"
Francisco Valim, presidente da Experian para quatro continentes
A escolha de Valim, um executivo com passagem por corporações como Oi
e Net e que comandou durante dois anos a Serasa Experian, braço
brasileiro do grupo britânico, se deve obviamente ao seu talento
profissional, à experiência que acumulou em corporações de grande porte e
aos resultados positivos que trouxe para as organizações para as quais
trabalhou. Mas existe um fator adicional que não deve ser desprezado e
que o próprio Valim admite ser cada vez mais valorizado no ambiente de
negócios internacional: o seu país de nascimento.
“Nos últimos anos, os executivos brasileiros passaram a ser vistos
com outros olhos no cenário internacional”, disse Valim à DINHEIRO. O
caso de Valim, que desde janeiro dá expediente num prédio no centro de
Londres, é notável. A Experian tem entre suas especialidades a análise
de créditos. Com a crise, a oferta de crédito minguou na Europa e, na
esteira desse processo, a performance da Experian foi afetada. Valim tem
a dura missão de restaurar o desempenho da empresa.
Se até pouco tempo atrás os executivos brasileiros que se destacavam
nas corporações mundiais eram considerados exceções, uma nova geração de
profissionais forjados no Brasil ganha cada vez mais espaço no
competitivo mercado de trabalho global. Uma pesquisa recente publicada
pela revista inglesa Human Resources, a bíblia do setor de recursos
humanos, mostra o grau de reconhecimento do profissional brasileiro no
Exterior.
"Falei para os meus funcionários nos EUA que quem entende de crise sou eu"
André Balbi, presidente da Rexam para as Américas
De acordo com a publicação, que entrevistou 22 mil trabalhadores de
18 países, o executivo brasileiro é apontado como o segundo mais
eficiente do mundo. À frente dele, só os indianos, que se tornaram gurus
da área de tecnologia e que tradicionalmente lideram esse ranking.
Segundo o estudo, os gestores do Brasil ultrapassaram pela primeira vez
americanos, canadenses e alemães.
Pesquisa revela que o executivo brasileiro é apontado pelas próprias empresas como o segundo mais eficiente do mundo
Um outro levantamento, elaborado pela consultoria Michael Page,
mostra a qualidade dos cargos ocupados por esses profissionais. Cerca de
40% dos executivos brasileiros expatriados nos últimos anos comanda uma
operação inteira, como é o caso de Valim na Experian, ou está no posto
de vice-presidente. “Profissionais com vivência no mercado brasileiro
nunca foram tão valorizados”, diz César Fontana, consultor para a
América Latina da Michael Page.
Um dos maiores experts do mundo em liderança e inovação, o indiano
Vijat Govindarajan, recentemente eleito pelo jornal inglês London Times
um dos 50 maiores pensadores da administração atual, vai na mesma linha
de raciocício. Segundo ele, os executivos que trabalham em países como
Brasil, Índia e China levam vantagem em relação a seus colegas de outras
nações. “As grandes mudanças acontecem nos países em
desenvolvimento, que em breve vão liderar a nova ordem econômica
mundial”, diz Govin-darajan. “É por isso que profissionais de países
emergentes têm maior potencial para causar impacto positivo em suas
empresas.”
Afinal, o que explica a ascensão do gestor com passaporte brasileiro?
Segundo especialistas, uma série de fatores levou esse profissional a
ser requisitado no Exterior. Para o headhunter Alfredo Assumpção,
sócio-fundador da Fesa, empresa que atua no ramo de recrutamento de
executivos, um dos motivos pode ser chamado de óbvio. “Parece banal, mas
é sabido no mundo inteiro que os brasileiros têm expertise em crise”,
diz Assumpção.
"Como eu não quis ir para Miami, a empresa mudou seu escritório para o Rio"
Aurélio Lopes, presidente da Giovanni+DraftFCB
Aurélio Lopes, presidente da Giovanni+DraftFCB
Nos últimos 25 anos, os sucessivos pacotes antiinflação que viraram
do avesso a economia brasileira ajudaram, ironicamente, a revelar uma
bem-sucedida geração de executivos brasileiros. “Esses profissionais
foram criados na adversidade e estão acostumados à volatilidade do
mercado”, afirma Assumpção. Nos últimos dois anos, o mundo desenvolvido
entrou em pânico com a turbulência financeira que fez estragos nos
balanços de diversas companhias multinacionais. Enquanto na Europa e nos
Estados Unidos falou-se, com enorme exagero, até na possibilidade de
falência do modelo capitalista, no Brasil os presidentes de grandes
companhias apontavam para um futuro muito mais otimista.
“O mundo vai de mal a pior? Não adianta ficar paralisado. É preciso
se mexer.” A frase foi dita a subordinados pelo executivo carioca André
Balbi ao assumir, em julho de 2009, o cargo de presidente das Américas
da Rexam, maior fabricante mundial de latas de alumínio, com vendas
anuais na casa de US$ 8 bilhões. Balbi comanda hoje alguns milhares de
funcionários de 27 fábricas da Rexam espalhadas no continente americano
(são 16 na América do Norte e 11 na América do Sul).
Na primeira semana de trabalho, Balbi tomou uma medida simples, porém
simbólica. Trocou as 100 impressoras (era uma para cada funcionário
diretamente subordinado a ele) por um único equipamento. “Eu queria
passar um recado. Era como se dissesse para a turma que de crise eu
entendia.” Balbi concorda com a análise feita pelo consultor Assumpção.
“Como nós vivemos durante muitos anos no aperto, nos habituamos a
prestar mais atenção nos detalhes, enquanto executivos de países
desenvolvidos, em geral, analisam os problemas com maior
distanciamento.” Num certo sentido, isso representa uma vantagem quando
há a necessidade, por exemplo, de cortar custos. “Os brasileiros são
especialistas em fazer mais com menos”, afirma Balbi.
Esse é apenas um dos aspectos que levaram os gestores do Brasil a ir
longe. “Um fator decisivo para a valorização do profissional brasileiro é
o próprio momento da economia do País”, afirma Fontana, da Michael
Page, de certa forma concordando com a análise do indiano Govindarajan.
Segundo Fontana, a subida de vários patamares na escala de eficiência
das empresas nacionais, algo que vem acontecendo de forma mais intensa
nos últimos cinco anos, fez com que naturalmente os profissionais dessas
corporações passassem a ser cobiçados. Grupos como Odebrecht, Camargo
Corrêa, Natura e Gerdau, para ficar só em alguns exemplos,
intensificaram seus investimentos no Exterior e nesse embalo ajudaram a
formar uma geração de profissionais que trazem no currículo a chancela
da competência.
Há duas semanas, a revista americana Fortune publicou um
ranking com as corporações que mais formam líderes. A lista foi
encabeçada pela IBM. No 11o posto entre mais de uma centena de
corporações analisadas aparece a brasileira Natura. Para o
consultor da Michael Page, isso também é reflexo da formação acadêmica
do profissional do Brasil. Estudos recentes mostram que o País está
entre os que mais oferecem cursos de especialização, como MBAs e
doutorados.
Um terceiro fator que não deve ser menosprezado é a própria
disposição dos brasileiros em construir uma carreira internacional.
Segundo dados do Ministério do Trabalho, existem mais de dois milhões de
brasileiros trabalhando legalmente no Exterior. Para efeito de
comparação, é metade do número de chineses expatriados, com a diferença
de que a população da China é quase seis vezes maior que a população do
Brasil. Aqui entra em jogo o aspecto cultural.
Os chineses são muito mais fechados que os brasileiros, o que para
eles acarreta a desvantagem da dificuldade de adaptação. Além disso,
poucas nações no mundo carregam no DNA o que se pode chamar de espírito
ao mesmo tempo criativo e flexível. Você consegue imaginar um executivo,
digamos, alemão cozinhando uma moqueca para 600 subordinados? Foi isso o
que fez há alguns dias o gaúcho Nelson Mattos, vice-presidente de
engenharia do Google para a Europa, Oriente Médio e África – é o cargo
mais alto já ocupado por um brasileiro numa das empresas mais inovadoras
do mundo.
" O brasileiro é capaz de entender o mundo multi-cultural em que vivemos"
Nelson Mattos, VP do Google para a Europa
“Num encontro na Suíça, eu e um colega também brasileiro decidimos
preparar as 600 refeições”, diz Mattos. Não foi apenas uma brincadeira.
“Ao cozinhar para a minha equipe, criei um nível de comprometimento que é
difícil de encontrar em outra empresa. Ações como essa servem inclusive
como motivação para as pessoas, que se sentem mais engajadas no grupo.”
Mattos, que vive fora do Brasil há 26 anos, comanda uma equipe de mil
engenheiros, das mais variadas nacionalidades e com culturas
completamente diferentes, que vão de africanos e árabes a europeus.
Muitos dos produtos usados cotidianamente foram desenvolvidos pelos
engenheiros comandados pelo brasileiro. Um exemplo é o Google Suggest,
recurso inserido na busca do Google que completa automaticamente os
termos quando o usuário começa a digitar uma palavra.
“Criado em Israel e testado na China, países onde escrever no
computador é sempre mais difícil, por causa da língua, o sistema acabou,
por sugestão minha, adaptado para o mundo inteiro”, afirma Mattos. “Se
eu não fosse nascido no Brasil, um país com tantas culturas diferentes,
talvez tivesse dificuldade em enxergar o mercado de forma mais aberta e
talvez o Google Suggest não tivesse sido criado”, diz o executivo. Ele
completa: “Acho que a principal qualidade do brasileiro é a sua
capacidade de entender e valorizar o mundo multi-cultural em que
vivemos.”
Encarar uma carreira internacional pressupõe uma série de mudanças na
vida pessoal. Mas nem sempre os profissionais estão dispostos a
realizá-las. Presidente da agência de comunicação DraftFCB para a
América Latina, Aurélio Lopes, um dos pioneiros em marketing de
relacionamento no Brasil, ex-executivo da Shell e do antigo Banco
Nacional, recebeu no ano passado uma proposta que parecia irrecusável:
acumular o seu atual cargo com o de presidente da Giovanni+DraftFCB.
Para isso, ele deveria ser transferido do Rio de Janeiro para Miami. Sua
resposta foi imediata: “Não.”
Casado pela segunda vez, pai de uma menina, Lopes nem pensava em
voltar a trabalhar no exterior. “A prioridade era minha família e não o
dinheiro”, diz. Dias depois, a empresa tomou uma decisão inesperada. Se o
executivo não poderia ir a Miami, Miami iria até ele. “A companhia
transferiu toda a operação para o Rio de Janeiro”, diz. “Eu, obviamente,
aceitei na hora a proposta.”
Ele assumiu o posto em janeiro deste ano. Logo depois, com o aval da
matriz, trocou os 12 funcionários americanos que trabalhavam na sede em
Miami por 12 brasileiros que passaram a atuar ao seu lado no escritório
do Rio de Janeiro. Nos corredores da empresa, a brincadeira é que, neste
caso, o Brasil ganhou dos Estados Unidos de goleada. Pelo menos no
mundo dos executivos, essa vitória é hoje uma realidade.
Fonte: Com reportagem de Carolina Matos e Ralphe Manzoni Jr.